18.5.11

Psicologia, psiquiatria, religião, espiritualidade e saúde: problemas de definição e conceituação.

o que é a religião?
Como ela atua no psiquismo?
Desde muito a psicologia tem se dedicado ao estudo do fenômeno religioso. Wundt dedicou boa parte de sua psicologia dos povos à religião; William James chegou, até mesmo, a estudar médiuns e paranormais; Allport, em seu estudo sobre a personalidade, tentou desevendar as maneiras em que a religião afeta a condição humana; Freud tentou explicar a origem e função da religião; Jung se aproximou do fenômeno de maneira ampla, buscando compreender a religião do ocidente e do oriente; os humanistas, como Maslow, deram impulso à Psicologia transpessoal; Ken Wilber, numa miscelânea de zen budismo, quântica e psicologia, tentou ampliar a percepção do fenômeno.

Ufaaaaa....enfim, a história é longa. Isso, porque eu omiti nomes importantes, como os de Stanislav Grof, Jacques Lacan, Leuba, e muitos outros.

Contudo, em todos os autores citados, persiste o mesmo problema. Como podemos definir religião? e espiritualidade? Afinal, para conduzirmos um estudo científico sobre o tema, precisamos adequá-lo ao método científico que, por sua vez, tem lá suas exigências.

Moreira-Almeida e Koenig, dois renomedos pesquisadores da área médica que se dedicam ao estudo do fenômeno religiosos a décadas, levantaram , em 2006, o problema da definição de "espiritualidade". E, por que eles fizeram isso? Porque a OMS está interessada em desenvolver, progressivamente, métodos de mensuração de qualidade de vida (WHOQOL). Há algum tempo, estes pesquisadores ligados à OMS tentam incluir uma nova dimensão na escala - "espiritualidade, religião e crenças pessoais" - procurando compreender como esta faceta afetaria a qualidade de vida das pessoas. É aí que mora o problema: o que seria "religião, espiritualidade e crença pessoal"? como definir essa miscelânea? Moreira-Almeida e Koenig questionaram que elementos como "esperança, sentido da vida, otimismo, perdão e a sensação de espanto e admiração" não deveriam ser considerados elementos de uma "espiritualidade". Argumentam que marxistas históricos, por exemplo, poderiam se sentir "ofendidos" se chamados de "espirituais". Que quiprocó!

Em 2006, Moreira-Almeida e Koenig, em resposta à tentativa do WHOQOL em adicionar a faceta da espiritualidade, propuseram a seguinte definição (a fim de clarear o que seria espiritualidade):

1 - Religião: um sistema organizado de crenças, práticas, rituais e símbolos projetados para facilitar a proximidade com o sagrado ou transcendente (Deus, poder superior, ou verdade/realidade absoluta).

2 - Espiritualidade: a busca pessoal pela compreensão de respostas para as perguntas fundamentais sobre a vida, o significado, e a relação com o sagrado ou transcendente, o que pode (ou não) levar a/ou originar-se do desenvolvimento de rituais religiosos ou formação de comunidade.


A resposta do grupo que desenvolveu o WHOQOL-SRPB (módulo espiritualidade) está em: http://www.hcnet.usp.br/ipq/revista/vol34/s1/146.html

" Moreira-Almeida e Koenig identificaram outro problema de definição que parece ser mais um paradoxo do seu próprio trabalho do que do nosso. Eles citam o artigo de Koenig et al. (2001) em que a espiritualidade é definida como “a busca pessoal pela compreensão de respostas para as perguntas fundamentais sobre a vida, o significado e a relação com o sagrado ou o transcendente que pode (ou não) levar a ou originar-se do desenvolvimento de rituais religiosos e da formação da comunidade”. Dentro da sua própria definição de espiritualidade, vemos que a espiritualidade é considerada uma extensão da religião. Em oposição a isso, o Grupo WHOQOL-SRPB não conecta a espiritualidade à religião na pesquisa sobre a QV, observando que as pessoas com pontos de vista agnósticos ou ateístas também podem ter uma vida espiritual rica. Tais crenças estão amplamente documentadas pelos antropólogos sociais e já podem ser avaliadas de maneira geral. Os dados qualitativos de 18 países demonstram que os agnósticos e os ateus experimentam e conseguem relatar a espiritualidade relacionada à sua qualidade de vida, o que os ajuda a enfrentar a adversidade (O’Connell e Skevington et al., 2004). Os agnósticos acreditam que alguma coisa mais elevada e com maior poder existe além do mundo material, ao mesmo tempo em que reconhecem ter dúvidas sobre a exata natureza disso. Essas pessoas deixam claro que para elas isso não envolve religião, mas poderia ser, por exemplo, a força curativa da Natureza. Os ateus, por outro lado, não acreditam em uma entidade mais elevada nem religiosa, mas têm crenças pessoais fortes que podem tomar a forma de uma teoria científica como o darwinismo ou a psicanálise. De maneira alternativa, eles podem ter uma filosofia pessoal ou acreditar em um código moral/ético como o feminismo, o ambientalismo, o marxismo ou uma maneira de viver peculiar. Ao conceitualizarmos essa área de maneira bem mais ampla, somos capazes de mais bem entender as diferenças individuais nesse campo desafiador. Essa flexibilidade também nos capacita a compreender como as pessoas se deslocam de uma posição espiritual para outra ao longo de suas vidas. Por exemplo, a QV pode mudar aos 19 anos para uma pessoa que rejeita o cristianismo ao aprender sobre a psicanálise. Essa mesma pessoa pode receber influência do feminismo aos 27 anos e do ambientalismo aos 38 anos e mudar ainda mais com a descoberta do budismo aos 58 anos. Se aplicarmos uma definição que conecte a QV espiritual somente à religião, perderemos as oportunidades científicas ricas de investigar as muitas áreas da experiência espiritual dessa pessoa ao longo de sua vida." (excerto)

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