Eduardo Pinheiro, ou Padma Dorje, mantém o melhor site brasileiro sobre budismo - o www.tzal.org. Segue abaixo um recorte de uma parte do seu site...aproveitem para esclarecer suas dúvidas...
Vale a pena uma visita ao site!
O texto possui umas inclusões minhas para maior compreensão do público leigo. Como o Padma é bem austero, pediu para que eu deixasse claro as minhas inserções. Elas estarão em colchetes, como manda a regra!
O texto possui umas inclusões minhas para maior compreensão do público leigo. Como o Padma é bem austero, pediu para que eu deixasse claro as minhas inserções. Elas estarão em colchetes, como manda a regra!
No sentido kardecista, não. Há várias diferenças, sendo que a principal é a noção de samsara, no qual as várias existências não são necessariamente um aprendizado, e não há necessariamente uma evolução. Pelo contrário, as muitas existências, em geral, são só uma vastidão de sofrimento e falta de sentido — até que o dharma é praticado, e ele não é necessariamente praticado (isto é, não é uma evolução natural, mas uma deliberação de, relativamente, poucos).
A reencarnação no budismo tem alguma semelhança com o que acham os espíritas?
Alguma semelhança existe, mas há diferenças.
Os espíritas em geral estão focados em algumas poucas vidas, e uma evolução necessária. No budismo já se passaram tantas vidas que todo mundo já foi mãe de todo mundo — então embora haja em certa medida essa coisa espírita de que seu filho pode ter sido o seu bisavô, a coisa em geral é muito mais vasta. Um professor viu uma pessoa atirando pedras num cachorro que atacava um caranguejo e disse "atira pedras na mãe, que devora o pai". No espiritismo, no máximo a pessoa estaciona, porque se considera que certas conquistas não são perdidas, como o renascimento humano. No budismo o renascimento humano é muito fácil de se perder.
Em geral, também, no espiritismo a crença em vidas futuras é vista como um alento — a pessoa não cessa, o "eu" não cessa, ele é só abalado pela falta de memórias. No budismo as vidas futuras são apenas mais sofrimento [pois continuamos a "girar" no Samsara - iludidos]. O objetivo do hinayana [forma mais antiga de budismo] é essencialmente eliminar as emoções aflitivas, porque são elas que levam a um novo nascimento. No mahayana [budismo mais moderno] isso muda um pouco de figura, porque você pode renascer com a aspiração de trazer benefício. Mas mesmo no mahayana e no vajrayana [budismo tântrico] se faz a diferença entre emanação e renascimento, isto é, renascimento lúcido (escolhido, não-compulsório) e renascimento a que se é levado pelas emoções aflitivas [pelo carma].
Enfim, como o budismo não aceita um "eu", o que renasce não é o que a pessoa pensa que é si própria, mas o carma que ela criou. Em outras vidas esse carma produz outras noções equivocadas de um eu, outros apegos a um eu que não existe — e essa é a base do sofrimento.
Através da prática de meditação, no entanto, é possível reconhecer as estruturas cármicas, algo até como um histórico delas, e assim reconstruir os outros apegos ao eu baseados nessas estruturas. Essas estruturas são individuais em certo sentido, mas boa parte delas é comum a certas experiências, como ser humano, falar uma língua, e assim por diante. Da mesma forma que o DNA, em que parte é propriamente individual, e parte é comum a espécie, à família, e assim por diante. Quanto mais fundo se vai na meditação, portanto, menos subjetiva ela é. O nosso fluxo ordinário é extremamente subjetivo até mesmo para nossa percepção ordinária, isto é, achamos isso e logo depois achamos aquilo. É mais que subjetivo, é quase aleatório. Já quando desenvolvemos estabilidade e claridade (abertura no "obturador"), os movimentos rápidos da mente ficam difusos, e as estruturas mais básicas, que formam certas características mais globais podem ser discernidas.
VÁRIAS EXISTÊNCIAS, DIFERENTES "CORPOS" - MAIOR OU MENOR SOFRIMENTO - MAS SEMPRE PRESENTE... |
Através da prática de meditação, no entanto, é possível reconhecer as estruturas cármicas, algo até como um histórico delas, e assim reconstruir os outros apegos ao eu baseados nessas estruturas. Essas estruturas são individuais em certo sentido, mas boa parte delas é comum a certas experiências, como ser humano, falar uma língua, e assim por diante. Da mesma forma que o DNA, em que parte é propriamente individual, e parte é comum a espécie, à família, e assim por diante. Quanto mais fundo se vai na meditação, portanto, menos subjetiva ela é. O nosso fluxo ordinário é extremamente subjetivo até mesmo para nossa percepção ordinária, isto é, achamos isso e logo depois achamos aquilo. É mais que subjetivo, é quase aleatório. Já quando desenvolvemos estabilidade e claridade (abertura no "obturador"), os movimentos rápidos da mente ficam difusos, e as estruturas mais básicas, que formam certas características mais globais podem ser discernidas.
Agora, o objetivo da prática de meditação não é lembrar vidas passadas. A única utilidade de lembrar vidas passadas, para o budismo, é entender quão fúteis foram nossos esforços anteriores e não cometer os mesmos erros. Isto é, se focar mais urgentemente no dharma, e não nas atividades em que temos nos focado vida após vida e que não nos levaram a lugar algum.
Então há diferença entre o renascimento ou reencarnação (esta palavra inclusive sendo evitada de propósito) no budismo e no espiritismo. Há diferenças cruciais como 1) ausência da noção do eu; 2) ausência de uma evolução necessária (os renascimentos são chamados de "experiência cíclica" no budismo, a pessoa sempre melhora e piora, até a iluminação, quando ela não mais renasce — no espiritismo alguém não volta mais como animal, por exemplo — as conquistas intelectuais são definitivas.
Não sei como eles explicam o alzheimer e outras doenças degenerativas — como a pessoa volta a ser inteligente? a inteligência deve permanecer latente no "perispírito" ou algum lugar assim, realmente não sei). Já no budismo é muito claro que toda conquista intelectual pode ser perdida nesta mesma vida, de um momento para o outro, e não é nada de especial; 3) renascer não é um conforto, não é uma continuidade do eu, pelo contrário; 4) o reino humano é o que mais possui oportunidade para a prática espiritual (outros reinos mais "sutis" não são melhores); 5) não se foca em questões familiares, de algumas dezenas de vidas e de um círculo restrito de pessoas, mas no fato de que todos já foram nossa mãe, gato, cachorro e papagaio, são vidas incontáveis e temos conexão com todos os seres;
Pode haver mais alguns itens, mas não sou profundo conhecedor do espiritismo. Sei que é uma doutrina recente, basicamente brasileira na atualidade, embasada em paradigmas científicos do séc. XIX e no positivismo da época. Não há métodos para o refino dos instrumentos epistêmicos, há o cristianismo como base de fundo, e é uma doutrina teísta.
Se nós fossemos comparar o espiritismo com o hinduismo também haveriam vários pontos a diferenciar, embora ambos acreditem na noção de um eu.
O oráculo no budismo tibetano é semelhante. Outras formas de budismo não possuem "mediunidade", talvez alguma forma japonesa, mas não estou certo.
NECHUNG - um dos oráculos centrais do budismo |
Como funciona, até onde eu entendo, nunca recebi explicações sobre isso, é que a pessoa tem uma fisiologia sutil que pode entrar em ressonância com uma outra fisiologia sutil. Mas nenhum ensinamento que eu li ou ouvi nunca mencionaram isso. Ouvi isso de um budista num congresso espírita que eu fui obrigado a comparecer porque era tradutor de um dos participantes. Na sala de prática mesmo, e no contexto budista geral, fora uma cena no filme "Kun Dun" do Martin Scorcese, e perguntas de visitantes espíritas, não parece ser algo que tenha importância para a prática.
Ah, mas todas as formas de budismo não tem problemas com "seres invisíveis". Quer dizer, para todas elas, eles existem. Só que são objetos de compaixão, como os seres visíveis.
2 comentários:
parei de ler em :"Os espíritas em geral estão focados em algumas poucas vidas". Um conselho..Sei que já se passou anos desde essa publicação, mas procure estudar as bases fundamentais da Doutrina Espírita. É muito semelhante ao budismo. Abrass
Concordo com o comentário acima.
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