25.7.11

Vida após a morte? Estragando um argumento em 6 passos

Na minha opinião o texto abaixo é uma "malandragem", no bom sentido. O autor pretende ficar "em cima do muro", ser imparcial, mas, claramente, não é ( - é nítido). Publico o texto no íntegra (como destaques em negrito que eu fiz no original). Ao final do texto, teço comentários.

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Para onde vamos depois que morremos? Por Alexandre Montagna, Sábado, 1 Maio 2010 | 20:08


Sensato é considerar que morrer é ir a todo lugar. E, ao mesmo tempo, a lugar algum.

Desconverse quando alguém começar a falar nas vidas após a morte, reencarnação, reencadernação, etc. Os que consideram vidas vindouras são crentes, porque acreditam. Os que preferem saber são agnósticos quanto a isso. Vida após a morte é fitfty-fifty (“cinquenta-cinquenta”), ou seja, pode haver como pode não haver. Comprovar por via racional, em tese, não há como. Não há indícios de que exista tal façanha, e os registros mediúnicos de pessoas mortas que paranormais alegam ter feito e que vez ou outra escutamos falar podem perfeitamente serem compreendidos à luz da esperta linguagem genérica, que é a arte de falar muito sem dizer nada, parecendo que se disse tudo.



Por outro lado…

“Yo no creo en brujas, pero que las hay, las hay!”
Miguel de Cervantes

“Hay, sí, pero no son brujas.”
Alexandre Montagna

Quando o pensador não-religioso e não-crente pensa, ele prefere levantar hipóteses sem apegar-se a elas freneticamente. Levantemos uma questão: quando morremos, para onde vão os nossos registros emocionais e mentais, como as nossas memórias? Para um materialista-seco tudo se acaba e ponto final. Está bem, vá lá. Pode ser isso mesmo. Entretanto, levantemos uma hipótese (hipóteses podem ser levantadas, não?): e se, ao morrermos, os traços de nossa personalidade ainda vagassem pela atmosfera? Ora, se você acha muito estranho o que estou falando, vale lembrar que neste exato momento há diversas ondas hertzianas viajando ao seu redor. 

São ondas de rádio-frequência que estão há muito tempo no ar, foram disparadas e seguem seu tráfego. (Um pouco de cultura geral profunda: cientistas declaram que boa parte da interferência nos sinais de televisão são ondas praticamente atemporais do Universo, radiação gerada desde o Big-Bang e que ainda estão por aí). Bem, e se nossos pensamentos fossem radioativos? Gerados e disparados no ar? E se pudéssemos desenvolver a capacidade de receptar os pensamentos em rádio-frequência que estão no ar? Bem isso seria a tão famosa telepatia. No mínimo, interessante. Mas, hei! E se o emissor dos pensamentos já estivesse morto? Aí então seria algo como a mediunidade, pois estaríamos escutando o que um morto disse*. Isso é, no mínimo, muito interessante!

* não diz mais, pois está morto – portanto, descartemos a possibilidade de conversa em tempo real com defuntos, coisas do tipo: “querida, eu morri mas estou bem, cuide das crianças” e etc.

Conclusão do cético-agnóstico-racional Montagna: duvide de tudo, mas não descarte nada. O mundo é louco o bastante para tudo ser possível. Aí alguém diz: – “Ué, Alexandre, mas se tudo é possível, então porque não acreditas nesta fantasia ou naquele delírio?”. Ora, é verdade que admito que tudo pode ser possível; ocorre que muita coisa é bastante improvável. Além do mais, eu não gosto de acreditar: prefiro saber! Se eu não souber, não preencherei minhas lacunas mentais com crenças. Isso, jamais! Aprofundando um pouco (e agora vem a parte mais metafísica do texto), eu defendo que não adianta dizer que isso ou aquilo é impossível porque, em pontos profundos, as nossas próprias vidas já são impossíveis. Não há motivos aparentes para estarmos aqui. Você já tentou regressar na história da humanidade, planeta, sistema solar e Cosmos? É uma loucura das grandes! Admito que, numa análise imparcial, nossa existência é bastante improvável. Entretanto, cá estamos, e há todo um Cosmos, micro e macro, a desvendar.

Vamos desvendá-lo!

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Comentários ácidos

O autor inicia o texto com uma frase fantástica, digna de virar jargão. Sensato é considerar que morrer é ir a todo lugar. E, ao mesmo tempo, a lugar algum. Logo em seguida manda o leitor "desconversar com alguém que fala sobre reencarnação", por exemplo. Ué, ninguém entendeu.

Contudo, quando lemos atentamente o texto, logo descobrimos umas falácias e desconhecimentos fundamentais. Analisemos quando o autor diz que "Comprovar por via racional [que existe vida após a morte], em tese, não há comoNão há indícios de que exista tal façanha, e os registros mediúnicos de pessoas mortas que paranormais alegam ter feito e que vez ou outra escutamos falar podem perfeitamente serem compreendidos à luz da esperta linguagem genérica, que é a arte de falar muito sem dizer nada, parecendo que se disse tudo".

1 - Comprovar a vida após a morte seria "apresentar provas" de que exista algo que sobreviva à morte - seja a consciência, alma, espírito, fragmentos invisíveis da personalidade, etc.

2 - O próprio autor lembrou aos leitores que existem coisas "invisíveis", tais quais as ondas de rádio, que existem, mas que nossos olhos não captam. São precisos instrumentos específicos. Portanto, algo ser visível, ou não, a olho nu não pode ser critério de existência. Caso contrário, vírus e bactérias não existiriam, o que sabemos ser uma inverdade.

3 - Ele erra quando diz que não há indícios. Há sim, vários, que estão atualmente sob o julgo da comunidade científica - não apenas as alegadas experiências mediúnicas, mas também as chamadas E.Q.M (experiências de quase-morte) e pesquisas sobre reencarnação (Stevensson, Haraldson, Tucker, etc), por exemplo. Há congresso inteiros organizados por instituições renomadas apenas para discutir esse tema.

4 - Quando o autor afirma que experiências mediúnicas podem "perfeitamente ser compreendidas à luz da esperta linguagem genérica, que é a arte de falar muito sem dizer nada, parecendo que se disse tudo" ele demonstra ampla ignorância acerca das pesquisas realizadas sobre o alegado fenômeno da mediunidade. Acho que ele emite uma opinião pessoal (pouco fundamentada, é claro). Este fenômeno vêm sendo estudado de maneira séria, ou seja, através do método científico, ha alguns anos. Se submetermos uma pesquisa com o termo "mediumship" (mediunidade) nos bancos de artigos da PubMED, teremos uma diversidade de estudos sobre o tema. No Brasil, o médico Phd Alexander Moreira-Almeida realiza pesquisas há décadas sobre o tema, inclusive através de neuro-imagem e outras técnicas modernas. Alguns dados de uma pesquisa que realizou com supostos médiuns no maior laboratório de neuro-imagem do mundo (Andre Newberg e equipe) estão tendo seus dados analisados. 

5 - Cientistas renomados, com cadeiras permanentes em instituições de alta credibilidade acadêmica, como Ian Stevensson (falecido), Jim Tucker, Haraldson, Sam Parnia, Pin Van Lommel, Stanley Krippner, Peter Fenwick, etc pesquisam o assunto da "vida após a morte", academicamente, há decadas. É muito tosco reduzir um fenômeno complexo, como a "mediunidade", a "luz da esperta linguagem genérica". É claro que muitos casos alegados de mediunidade não passam de truques e reflexos de doenças, mas daí dizer que o fenômeno é apenas isso é muita tosqueirice opinativa.


6 - O autor diz que quer "saber", ao invés de "acreditar". Ele pretende, assim dizendo, separar "fato" x "crença". Contudo, parece que o autor não tem treinamento em filosofia da ciência, já que desconsidera que há muita "crença" por detrás do fazer científico. Nossa realidade, nossa ação no mundo, enfim, a maneira como a realidade nos é vendida pela ciência, está repleta de "crenças". Veja o caso da filosofia fisicalista, por exemplo. Um pouquinho de Imre Lakatos para quem não entendeu nada.


ENFIM, o texto do colega é paradoxal e confuso.


Eu sempre digo, se quero me meter a falar sobre engenharia naval que, ao menos, eu saiba a diferença entre "poa" e "popa", senão...




entrevista com Jim Tucker (english)

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