A revista Superinteressante ed. 296 de outubro/2011 veio com a seguinte reportagem de capa:
Eles são cientistas. E eles acreditam em espíritos e reencarnação. Agora, estão usando o laboratório para tentar provar que isso não é apenas questão de fé. E dizem que estão conseguindo.
Se você ler com atenção a chamada da capa, verá que há um certo tom (velado) de ironia e deboche. A reportagem, no interior da mesma, é prova cabal da atitude "imoral" e "pouco profissional" dos editores e repórteres.Os jornalistas concluem a reportagem em tom de deboche, dizendo que "há muitas evidências contra os fenômenos espíritas e que, dessa forma, os cientistas que estudam esses fenômenos agem movidos pela fé, e não pela ciência". Coisa lamentável.
Publico abaixo uma carta do médico Alexander Moreira-Almeida, um dos entrevistados pela equipe da Super-Interessante.
O problema é esclarecedor para todos, especialmente para os amigos jornalistas.
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Prezado Sr.
Sérgio Gwercman
Diretor de
redação da revista Superinteressante,
Como
o objetivo da reportagem “Ciência espírita” era apresentar o trabalho
desenvolvido por mim e por outros pesquisadores de experiências espirituais,
surpreendeu-me o fato de a revista ter ignorado uma longa entrevista que
concedi em 1/9/2010 ao repórter Pablo Nogueira, autor da matéria. Por isso,
disponibilizei as principais partes da entrevista no site www.ufjf.br/nupes.
Tendo
em vista a busca de rigor que deve nortear o trabalho de jornalismo científico,
seria preferível que a matéria fosse escrita em linguagem mais precisa, sem o
uso de ironias.
Ao contrário do que foi publicado:
- não se trata de “Ciência Espírita”, mas de ciência acadêmica convencional, realizada por grupos de pesquisa, em importantes universidades do mundo, que utilizam as ferramentas da ciência para explorar certos tipos de experiências humanas;
- em nenhum momento de meu artigo sobre cirurgia espiritual (publicado pela Revista da Associação Médica Brasileira) afirmei a necessidade de “mais investigações sobre o ‘mundo espiritual’”, como foi citado entre aspas na reportagem;
- o Programa de Saúde, Espiritualidade e Religiosidade (ProSer) do Instituto de Psiquiatria da USP não foi fundado em 1999, mas em 2008. Em 1999, foi fundado o NEPER (Núcleo de Estudos de Problemas Espirituais e Religiosos), que posteriormente originou o ProSer;
- não foi o neuropsiquiatra inglês Peter Fenwick quem popularizou as EQMs, mas sim o psiquiatra norte-americano Raymond Moody Jr;
- não há evidências para a afirmação de que “a maior parte dos pesquisadores entende que elas (as EQMs) não passam de confusão cerebral”. Além disso, a maioria dos pesquisadores que efetivamente publicaram estudos rigorosos sobre EQM discordam desta explicação;
- meu nome é Alexander Almeida e não Alexandre Almeida;
- o I Simpósio Internacional Explorando as Fronteiras da Relação Mente-Corpo não foi realizado “em (de novo) Juiz de Fora”. Ele ocorreu em São Paulo, no Centro de Convenções Rebouças da Faculdade de Medicina da USP, com o apoio da USP, Universidade Federal de Juiz de Fora – UFJF, Associação Brasileira de Neurociência Clínica e Associação Brasileira de Medicina de Emergência;
- o simpósio não teve como pauta “relatos de experiências transcendentais, filosofia e surrealidades da física quântica”, mas a apresentação interdisciplinar de estudos acadêmicos já realizados sobre as implicações das experiências espirituais para a relação mente-cérebro. Todos os conferencistas e debatedores são pesquisadores de destaque no meio científico internacional. O conteúdo deste simpósio será publicado em novembro de 2011 na forma de livro por uma das mais importantes editoras científicas do mundo, a Springer. O prefácio do livro é do psiquiatra Robert Cloninger, que está entre os 100 pesquisadores na área de psicologia e psiquiatria mais citados em revistas científicas no mundo;
- há carência de evidências de que seria “desnecessário dizer que as pesquisas com reencarnação são severamente criticadas pela academia”. Os principais pesquisadores na área (como Ian Stevenson e Erlendur Haraldsson) são da própria academia e publicam em periódicos científicos prestigiosos. Embora naturalmente haja debates sobre este tipo de pesquisa, o trabalho deles tem sido reconhecido como de qualidade em editoriais e resenhas em algumas das mais importantes revistas médicas do mundo, como American Journal of Psychiatry vol. 162, pag.823-4, 2005; British Medical Journal vol. 334, pag.700, 2007; Journal of Nervous and Mental Disease 1977 vol.165, pag.:151, 1977;
·
todos os pesquisadores citados discutem com
seriedade, em suas publicações, as diversas hipóteses explicativas sobre essas
experiências e não dizem que elas implicam necessariamente uma dimensão humana
extra-corpórea;
·
pelo rigor e reconhecimento deste trabalho pelo
meio acadêmico internacional, é fácil perceber que estes pesquisadores se movem
mais pelo interesse científico de exploração rigorosa e não dogmática da
natureza humana do que pela fé.
Alexander
Moreira-Almeida
- Professor da Faculdade
de Medicina da Universidade Federal de Juiz de Fora – UFJF
- Diretor do NUPES -
Núcleo de Pesquisas em Espiritualidade e Saúde da UFJF
- Coordenador Geral dos
Programas de Pós-Graduação Stricto-Sensu da UFJF
PS.: o texto desta carta, que espero ver
publicada no próximo número de Superinteressante, e as principais partes da
entrevista concedida à Superinteressante seguem também em anexo
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Pronto, está desfeito o deboche incitado pelos péssimos jornalistas da Super-Interessante!!!!!
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