5.12.11

o Éter, o Flogisto, Deus e a ciência

Texto de Ludwig Krippahl, original em http://ktreta.blogspot.com/2008/02/deus-e-cincia.html


O leitor que assina JC comentou há uns tempos que «A ciência exclui do seu âmbito a questão de deus porque ela ainda não foi constituída como seu objecto de estudo.» Engana-se. Deus já foi tão objeto da ciência como é hoje o elétron.

ninguém nunca viu isso, de fato
Ninguém duvida que o elétron seja objeto de estudo científico, mas ninguém consegue ver, cheirar, ouvir ou sentir elétrons. Vemos faíscas, ouvimos detectores, sentimos choques, observamos reações químicas e explicamos essa diversidade de fenômenos como sendo causada por elétrons, mas não podemos apontar para uma coisa e dizer isto é o elétron. Este objeto fundamental da física moderna não é uma coisa. É uma explicação.

É claro que existem elétrons. Não são só imaginação nossa. Seria uma enorme coincidência que um conceito como este explicasse tanta coisa sem corresponder a algo real. Mas é importante perceber que a nossa confiança na existência do elétron não vem de alguma observação direta. Vem apenas do poder que este conceito tem em explicar um grande número de dados. Tal como Deus, antigamente.

Para Isaac Newton a gravidade era obra de Deus. Newton considerava absurdo que a matéria tivesse a capacidade natural de se atrair através do espaço. Esta força tinha que ser um dom especial concedido e mantido por Deus. A geologia antes de Lyell, a biologia antes de Darwin, a arqueologia, a história e muitas outras disciplinas tinham Deus como objeto de estudo exatamente da mesma forma que a física moderna tem o elétron como objeto de estudo. Deus era, como o elétron é, um conceito central na explicação de um grande número de fenômenos. E, nessa altura, parecia muito estranho que Deus não correspondesse a algo real.

O que mudou entretanto não foi o método da ciência. Foram as explicações. Einstein, munido das equações de Maxwell, partiu de um princípio diferente: a velocidade da luz é uma constante universal. Tem que ser a mesma aqui, numa nave espacial ou em Júpiter. E dai nasceu a relatividade, uma explicação muito melhor que a de Newton

Não é melhor por não ter Deus. Isso não importa. É melhor porque explica mais coisas e com mais rigor. Mas, casualmente, além de ser melhor, não tem Deus, e por isso Deus saiu desta explicação.

O que aconteceu com a física aconteceu com a biologia, a geologia, a bioquímica e o resto da ciência. Sistematicamente, as explicações melhores eram explicações sem Deus. A ciência não expulsou Deus por questões ideológicas. Deus simplesmente murchou e caiu por falta de utilidade. Como o calórico, o éter, o flogisto e tantas outras ideias que pareceram boas na altura mas que, afinal, não eram.

A teoria do Flogisto parecia boa, mas não é....

É um erro infeliz julgar que Deus está para além da ciência. Compreende-se que alguém como Bento XVI queira dar esta ideia. O seu negócio depende disso. Mas infelizmente a ideia espalhou-se por muita gente, incluindo cientistas, a quem bastava olhar para a história para ver que não é Deus que está para além da ciência. A ciência é que ultrapassou Deus. E a culpa é de Deus por não servir de explicação para coisa nenhuma.



E você, leitor do blog...O QUE ACHA DISSO TUDO?

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